quarta-feira, 10 de junho de 2020

Estamos carentes

Depois de 35 anos de redemocratização, tem-se a impressão de uma latente fragilidade da nossa democracia. Todos os artigos, incisos e alíneas escritos naquele livro promulgado em 05 de outubro de 1988, que buscavam construir uma sociedade “livre, justa e solidária”, parece novamente ser abalada por figuras semelhantes às de 1964.

Entretanto não podemos deixar de reparar em aspectos alimentados por nossa sociedade para que chegássemos a esse ponto. Afinal, a política não se faz sozinha, é necessário todo o movimento social, em termos de cultura, valores e anseios para que se possa definir quem tomará a frente do país. Os rumos políticos, ao contrário do que muitos pensam, não se definem (somente) nas urnas, mas no jantar depois do trabalho, nos almoços de domingo, nas discussões entre amigos e família sobre política e demais ramos e no que a mídia ventila como sendo de importância para o saber coletivo.

Através desses mecanismos e de mais alguns adendos, a sociedade se une, se divide e determina o rumo nos cargos eletivos da Administração Pública do país. E nesse momento nós estamos nos perguntando: quem nos representa?
O Brasil apostou em um político de carreira como chefe de Estado e Governo. Porém, esse não correspondeu aos anseios da maioria depois de ocupar a cadeira presidencial, e agora o país se depara com uma questão que é cruel para o brasileiro: quem nos salvará?

Infelizmente, a política virou um jogo de estrelas, e o que brilhar mais, leva, mesmo que seja um completo despreparado para o serviço. O brasileiro, nas suas conversas e debates, nas impressões sobre o que a mídia reverbera, elege seu mártir, seu salvador, e assim se isenta de qualquer responsabilidade que possa ter na vida pública, como se não fizesse parte da sociedade.

A polarização extrema tomou conta, o ideal de pluralismo político preconizado pela Constituição Federal parece ter se repartido em dois lados que não fazem muito além de apontar os defeitos em seus opositores, sem olhar para si próprios. Nisso, a sociedade agoniza. Figuras que mais prezam pela política que pelo interesse público alimentam a narrativa do “quem vai ganhar” em eleições futuras. A ideia republicana de governo escorre pelo ralo sem que muitos façam o barulho necessário para fechar essa ferida.

Em 16 de abril deste ano, o Ministro da Saúde Henrique Mandetta deixava seu cargo, após o já conhecido desentendimento com o atual Presidente da República. No dia seguinte, devido ao trabalho que fez junto ao citado Ministério, a tag #Mandetta2022 já era vista em publicações em redes sociais. O mesmo ocorreu quando o ex-ministro da justiça Sérgio Moro deixou o Governo. É escancarada a falta de uma representação digna dos valores democráticos do brasileiro. Não há essa figura, há uma sociedade perdida, buscando por um caminho, por alguém que represente o mínimo que seja necessário para se governar e não mais fazer o país prosperar, mas para fazer com que não entremos em queda livre num abismo sem fim.

Há carência de líderes, de representantes que não sejam narcisistas, preocupados com suas carreiras e não com seu país, preocupados em livrar amigos, familiares, de esquemas já conhecidos de captação de verbas públicas, etc. Aquele que demonstre uma honestidade mínima, carisma e identificação com a sociedade e seus problemas e também valores que a maioria considera importantes, ganha o nome entre a # e o 2022. Até lá, veremos essa busca de uma sociedade que não sabe mais o que pensar em um cenário político que agora se reduz a dois lados e não mostra uma alternativa pujante, a ponto de fazer com que digitemos seus números nas urnas.

E o que fica exposto, ao final, é o tamanho da falha em nosso sistema educacional, retratado em escolhas ruins e numa sociedade que se define pelo extremo, e agora padece de alguém minimamente competente para que governe o Brasil que outrora fomos, e hoje sentimos falta, mesmo que à época reclamássemos. Mas isso já é assunto para outro post...